A DETERMINAÇÃO DE ESTUDAR ONDE NÃO HÁ ESCOLA

"Só com estudos posso realizar os meus sonhos"
Nas comunidades mais recônditas de Moçambique, o acesso à educação continua a ser um dos maiores desafios enfrentados pelas crianças, especialmente pelas raparigas. A falta de infraestruturas escolares, longas distâncias até às instituições de ensino e a prevalência de práticas como as uniões prematuras colocam em risco o futuro de milhares de raparigas. Muitas acabam por abandonar a escola cedo, privadas do direito de aprender, crescer e construir os seus sonhos.
No distrito de Murrupula, província de Nampula, o projecto “Toda a Rapariga é Capaz” (EGC), financiado pelo Governo do Canadá e implementado pela ActionAid Moçambique, Rede HOPEM e Visão Mundial, está a transformar esse cenário. Com a criação de Espaços Seguros, o projecto oferece formação sobre direitos, igualdade de género, saúde sexual e reprodutiva, prevenção de violência baseada no género (VBG) e habilidades para a vida — tudo com o objectivo de garantir que permaneçam na escola e se tornem protagonistas da sua própria história.
Na comunidade de Nampaua, distrito de Murrupula, em Nampula, encontramos Valdemira Anselmo, uma rapariga de 14 anos, que apesar dos desafios que enfrenta, mantém viva a esperança de um futuro melhor através da educação. Valdemira estuda na Escola Primária de Nampaua e frequenta regularmente o Espaço Seguro.
“Aqui aprendo muitas coisas importantes. Falamos sobre os nossos direitos e como devemos lutar para continuar a estudar”, conta com um sorriso tímido, mas cheio de orgulho.
Valdemira está na 6ª classe, mas já deveria estar mais avançada no seu percurso escolar.
“Depois de terminar a 6ª classe, tive que repetir porque aqui não tem 7ª. Não há outra escola para continuar. Mesmo assim, não desisti”, explicou.
Valdemira vive numa comunidade onde só se lecciona até a 6ª classe, e a escola secundária para continuidade, está a quilómetros de distância, o que dificulta o acesso para muitas raparigas.
Determinada, insiste em manter-se na escola.
“Quero estudar até me formar. O meu sonho é ser professora para ajudar a minha comunidade", disse.
Durante a nossa visita, Valdemira levou-nos à Escola Primária de Nampaua e mostrou, com entusiasmo, a sala onde aprende todos os dias. Sentada na carteira, ao lado dos colegas, ouve atentamente as explicações e participa nas aulas. A sua dedicação é admirável.
“Estar aqui é importante para mim. Quero ser alguém na vida. Só com estudos posso realizar os meus sonhos”, afirmou.
Desde pequena, Valdemira foi educada através do sistema de ensino bilingue e expressa-se principalmente na sua língua local, o que representa mais um obstáculo no seu processo educativo. Ainda assim, mostra uma impressionante força de vontade.
No Espaço Seguro, as facilitadoras ajudam-na a compreender melhor os temas escolares e a reforçar o que aprende na sala de aula.
“Estas crianças têm muita vontade de estudar, elas aprendem muitas coisas aqui no Espaço Seguro. Elas também preferem continuar a repetir de ano para não ficarem em casa”, explicou a facilitadora Aida Ambrósio.
No Espaço Seguro as raparigas encontram uma rede de apoio, partilham experiências com outras raparigas que enfrentam os mesmos desafios e sonham com um futuro melhor.
A história da Valdemira é um espelho da realidade de milhares de raparigas em Moçambique. Apesar da determinação, veem os seus sonhos ameaçados pela falta de escolas, pela distância dos serviços básicos e por normas sociais que ainda limitam o acesso igualitário à educação.
Com o apoio do projecto “Toda a Rapariga é Capaz”, Valdemira não caminha sozinha. Representa uma geração que, mesmo em contextos difíceis, continua a lutar por um futuro com mais oportunidades.