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HABILIDADES PARA A VIDA: CURSO DE CORTE E COSTURA TRAZ ESPERANÇA PARA RAPARIGAS DE LUGELA: CONHEÇA A HISTÓRIA DA LÚCIA

Lucia

Em Moçambique, até 2019, existia uma rede escolar para o ensino primário (1ª a 7ª classes) composta por mais de 21.735 escolas para uma população estudantil na ordem dos 6.938.434 alunos. Estima-se, em 2020, que cerca de 1.2 milhão de crianças, das quais 55% raparigas, em idade escolar, estava fora da escola. Dentre alguns grandes desafios que o sector enfrenta, a prioridade está em: (i) reduzir o nível de analfabetismo; (ii) aumentar a segurança, adaptabilidade e reduzir as desistências na escola (iii) aumentar a disponibilidade, acesso e inclusão; (iv) melhorar os métodos de ensino e aprendizagem; e (v) aumentar o financiamento ao sector para dar resposta adequada aos problemas de expansão da rede escolar e melhoria da qualidade de ensino em todas as suas dimensões.

No país, estudos indicam que as raparigas têm enfrentado vários desafios no seu dia-a-dia, maioritariamente resultantes das desigualdades de género criadas pelas normas sociais, práticas e hábitos tradicionais nocivos, fraca retenção da rapariga na escola e baixo nível de conclusão dos estudos. Adicionalmente, estas raparigas enfrentam constrangimentos relacionados ao baixo acesso aos serviços de Saúde Sexual e Reprodutiva (SSR) e altos níveis de gravidezes precoces estimadas em 46,4%.

A educação constitui a chave para o futuro das crianças, bem como o desenvolvimento das comunidades. Ou seja, quanto mais as raparigas permanecem na escola, com habilidades para a vida, maior é a oportunidade de empoderamento económico, conhecimento dos seus direitos, acesso às informações sobre saúde, situação que diminui a sua vulnerabilidade. 

Neste contexto, o Comité Diaconal Evangélico para o Desenvolvimento Social (CODESA) que representa o Programa Local de Direito (PLD) nos distritos de Mocuba e Lugela, com apoio da Associação ActionAid Moçambique (AAMoz) levam a cabo iniciativas que visam empoderar a rapariga através de acções de habilidades para a vida.

Naquele PLD, o CODESA e AAMoz realizam actividades nas áreas de formação (informática, culinária e corte e costura), treinamento sobre a promoção dos direitos nas escolas (PRS), política de protecção e salvaguarda da criança, sensibilização sobre Violência Baseada no Género (VBG) e uniões prematuras, promoção da alfabetização dos adultos através da metodologia REFLECT, fortalecimento dos mecanismos formais e informais de combate a violência e monitoria das políticas públicas e advocacia para o aumento do financiamento e gestão transparente dos fundos do sector de educação.

No entanto, no centro de recurso de Munhamade, conhecemos Lúcia Jorge, de 9 anos, aluna da 3ª classe, na Escola Primária Completa de Munhamade Sede, que apesar de todos desafios enfrentados pelas crianças locais, destaca-se como uma esperança viva na comunidade.

Quando teve informações sobre a oportunidade de participar do curso de corte e costura no centro, Lúcia ficou bastante entusiasmada, uma vez que poderia adquirir habilidades práticas e confeccionar roupas para si e a sua família.

“Em Maio deste ano (2023) comecei a frequentar o curso de corte e costura aqui no centro juntamente com outros colegas. É algo que sempre quis aprender. Por isso, quando esta iniciativa surgiu não pensei duas vezes, falei com os meus pais sobre a minha intenção e eles apoiaram-me”.

Com o apoio dedicado dos seus pais, agricultores, que trabalham arduamente para sustentar a família, Lúcia encontra na educação uma porta para a realização dos seus sonhos.

“Não falto as aulas por nada. Gosto de aprender para um dia ajudar os meus pais. Gosto também das aulas de corte e costura leccionadas pela professora Adelaide Clemente. É realmente uma grande oportunidade para mim e meus colegas”.

Todos os dias percorre quase 10 km a pé para chegar a escola e muitas vezes pensou em desistir devido a distância e a falta de recursos para a compra de materiais escolares.

“Em algum momento pensei em parar de estudar mas, depois que iniciei o curso de corte e costura ganhei forças para continuar. A professora nos incentiva todos os dias a não desistir da escola, para sermos alguém na vida”.

Com a orientação da professora Adelaide Clemente, Lúcia frequenta as aulas quatro vezes por semana e faz parte de um grupo diversificado de 24 formandos, subdivididos em três turnos, de oito alunos cada, que incluem ao todo, vinte (20) raparigas e quatro (4) rapazes.

Além do curso de corte e costura, o centro dispõe de cursos de informática e culinária, proporcionando oportunidades variadas para o desenvolvimento pessoal e profissional das crianças.

A professora Adelaide conta que tem sido gratificante partilhar os seus conhecimentos sobre corte e costura para as crianças da sua comunidade. 

“Ao ensinar estas crianças acabo aprendendo muito com elas. São crianças desfavorecidas e vivem a muitos quilómetros de distância. Por vezes acabam por chegar tarde a casa mas, nunca desistem. Estou feliz porque aquilo que sei acabo por transmitir para elas, e isso vai ajudar no seu futuro”, disse a professora.

Lúcia tem um sonho: ser costureira para garantir o seu futuro, ajudar os seus pais e a sua comunidade.

Apesar dos desafios, como a falta de recursos e a necessidade de acompanhamento contínuo após as formações, Lúcia e os seus colegas estão firmes na busca por conhecimento e habilidades. O CODESA com apoio da AAMoz, pretendem continuar com os cursos de corte e costura, culinária e informática, de modo a capacitar mais rapazes e raparigas em direitos, protecção infantil e sensibilização sobre questões relacionadas com Violência Baseada no Género e uniões prematuras.

Assim como Lúcia, existem várias crianças desfavorecidas e vulneráveis da comunidade Munhamade Sede, que têm a oportunidade de frequentar os cursos oferecidos no centro de recurso local.

A história da Lúcia Jorge destaca a importância vital da educação e do apoio comunitário para capacitar crianças, raparigas, adolescentes e jovens não apenas para habilidades práticas, mas também habilidades para a vida, afim de promover direitos e uma vida mais digna.