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POUPANÇA E CRÉDITO ROTATIVO: 𝐉𝐎𝐕𝐄𝐌 𝐃𝐄𝐒𝐋𝐎𝐂𝐀𝐃𝐀 𝐂𝐎𝐍𝐐𝐔𝐈𝐒𝐓𝐀 𝐋𝐈𝐁𝐄𝐑𝐃𝐀𝐃𝐄 𝐅𝐈𝐍𝐀𝐍𝐂𝐄𝐈𝐑𝐀 𝐀𝐓𝐑𝐀𝐕É𝐒 𝐃𝐀 𝐏𝐑Á𝐓𝐈𝐂𝐀 𝐃𝐄 𝐀𝐂𝐓𝐈𝐕𝐈𝐃𝐀𝐃𝐄𝐒 𝐃𝐄 𝐆𝐄𝐑𝐀ÇÃ𝐎 𝐃𝐄 𝐑𝐄𝐍𝐃𝐀

Maria na sua mercearia que abriu com fundos de PCR

Maria João, deslocada de Cabo Delgado que teve de abandonar a sua terra natal, distrito de Muidumbe, em 2021, devido aos ataques terroristas, é exemplo de outros deslocados que procuram melhorar a sua vida fazendo poupança e crédito rotativo.

O conflito armado na província de Cabo Delgado e as alterações climáticas resultaram na deslocação de pelo menos 1 milhão de pessoas para várias províncias de Moçambique.

A questão de subsistência é um dos maiores desafios no processo de inserção dos deslocados ou reinserção das famílias retornadas.

Em resposta a estes desafios, a Associação ActionAid Moçambique (AAMoz), em colaboração com o Governo da Bélgica e diversos parceiros e actores estratégicos, tem levado a cabo diversas acções de resposta humanitária, com maior foco nas crianças, jovens e mulheres deslocadas.

A iniciativa de criação de Poupança e Crédito Rotativo (PCR), liderada pela ActionAid e Solidariedade Moçambique constitui uma alternativa para empoderamento económico das comunidades, e estimula os beneficiários a desenvolverem actividades de geração de renda para garantirem subsistência sustentável das suas famílias e comunidades.

Maria João, deslocada de Cabo Delgado que teve de abandonar a sua terra natal, distrito de Muidumbe, em 2021, devido aos ataques terroristas, é exemplo de outros deslocados que procuram melhorar a sua vida fazendo poupança e crédito rotativo.

De apenas 24 anos e mãe de dois filhos (gémeos), a jovem teve uma infância difícil. Muito cedo, perdeu os seus pais e, logo de seguida, foi viver com avô materno, por sinal antigo combatente de Luta de Libertação Nacional, em Moçambique. Conta que viveu e cresceu num ambiente de poucas oportunidades e baixa renda económica, tanto é que teve dificuldades para estudar.

Movida pela busca de sobrevivência, Maria, junto a sua família, rumou para a vizinha república da Tanzania, em 2009, na esperança de ver a vida mudar para o melhor. Em Tanzania, onde permaneceu por três anos, a família da Maria meteu-se em negócios, experiência que tempo depois importou para as suas origens, distrito de Muidumbe, em Cabo Delgado.

“Com o pouco que o meu avô ganhava como pensionista não dava para arcar com as despesas de casa, por isso a preocupação era de garantir alimento para nós”, disse o porquê de emigrar para a república da Tanzânia.

𝐎 𝐌𝐀𝐋 À 𝐄𝐒𝐏𝐑𝐄𝐈𝐓𝐀
Em 2020, quando tudo parecia estar num bom rumo, o povoado onde residia Maria João e sua família, no distrito de Muidumbe foi atacado pelos terroristas, onde das vítimas mortais de forma hedionda, estava o esposo da jovem. “Ali começou o mal”. Maria, passou a fazer parte das estatísticas de vítimas traumatizadas pelo conflito armado, em Cabo Delgado.

“O meu avô estava doente, depois de ter estado envolvido em acidente de carro, ele não conseguia andar. A minha irmã teve de adiantar e fugir com minhas duas crianças para o mato, eu e o meu avô fomos uns dos últimos a sair da comunidade, porque não tinha como carregá-lo. Ficamos no mato durante uma semana, na nossa saída, encontramos o corpo do meu primo, filho da minha tia, em estado de podridão, na semana em que fugimos, ele foi surpreendido a vender na barraca e foi assassinado pelos terroristas”, contou, com olhos cheios de lágrimas.

Sem meios alternativos de sobrevivência, a família de Maria deslocou-se para a província de Nampula, concretamente no posto administrativo de Namialo, distrito de Meconta, onde foi acolhida durante seis meses no centro instalado naquela região. É do centro de acolhimento onde decidiu reiniciar a sua vida amorosa conhecendo o parceiro que depois passou a seu esposo.

“Não penso em voltar lá [Muidumbe], porque destruíram tudo que eu tinha”, rematou Maria João ao adiantar que conhecer o actual esposo foi o melhor que lhe aconteceu nos últimos tempos, enquanto vítima dos ataques terroristas.

Depois de integrar no grupo de Poupança e Crédito Rotativo (PCR), no ano de 2022, a vida começou a mudar. Depois de poupar, decidiu junto do seu marido, pedir empréstimo de 5.000,00 mt (cinco mil meticais) e iniciar o negócio de venda de produtos de género alimentício aos moradores da área onde reside, o que passou a ajudar também no sustento da família.

“Antes de fazer parte do grupo de PCR, não tinha esperança de mudar o curso da minha vida e deixar de ser dependente. Cada dia era uma incerteza. Com este negócio, resultado do crédito, em média diária conseguimos 4.500,00mt (quatro mil e quinhentos meticais) a 7.000,00mt (sete mil meticais). Isso é muito importante para nossa família, não temos tido falta de alimentação. Por isso, ainda agradeço por fazer parte do grupo de PCR, está a melhorar a minha vida e de muitos de nós”, testemunhou.

Maria João é parte de 1.107 jovens membros de PCR, nos distritos de Nacala, Meconta e na cidade de Nampula, onde o objectivo é apoiar os jovens a melhorar a sua literacia financeira e aumentar a consciência sobre fontes de crédito disponíveis e acessíveis para o arranque e expansão de pequenos negócios.

O projecto de Poupança e Crédito Rotativo (PCR) é uma iniciativa que está a ser financiada pelo Governo da Bélgica, e beneficia de forma directa os cidadãos deslocados pelos ataques terroristas de Cabo Delgado, na sua maioria jovens e mulheres das províncias de Cabo Delgado, Niassa e Nampula.

De referir que, para além da iniciativa de Poupança e Crédito Rotativo (PCR), na sua prioridade programática de Resposta Humanitárias, a Associação ActionAid Moçambique, tem apoiado aos deslocados com kits de dignidade, apoio psicossocial, iniciativas de negócio, mudanças de comportamento através da implementação de agricultura resiliente ao clima (agricultura de conservação), formações técnico profissionais, entre outros.