PROTECÇÃO AOS DESLOCADOS INTERNOS: CONHEÇA A HISTÓRIA DE TOMÁSIA, MULHER RESILIENTE E AGENTE DE TRANSFORMAÇÃO NA COMUNIDADE
Tomásia é exemplo de uma mulher forte, resiliente e inspiradora. Natural do distrito de Palma, província de Cabo Delgado, viu-se deslocada da sua comunidade juntamente com o seu marido e mais dois filhos, devido aos ataques terroristas.
“ActionAid veio nos ajudar muito. Nem temos como agradecer. Através do Espaço Seguro, falamos abertamente sobre os nossos problemas e encontramos soluções. Sensibilizamos a comunidade sobre a Violência Baseada no Género e sentimos que as mulheres estão mais informadas sobre os mecanismos de denúncia”.
De acordo com dados recentes, cerca de 165.741 famílias, o equivalente a mais de 1.000.000 de pessoas são deslocadas por causa das acções terroristas e buscam refúgio em zonas mais seguras no sul da província de Cabo Delgado (cidades e distritos) e em outras províncias como Nampula, Zambézia e Niassa. Esta situação tem contribuído para o aumento das necessidades urgentes de apoio em abrigos de emergência às populações deslocadas e suas comunidades de acolhimento.
Face a este cenário, as mulheres e raparigas deslocadas correm o risco de sofrer múltiplas formas de Violência Baseada no Género (VBG), incluindo violência sexual, rapto, violência entre parceiros íntimos, união prematura e violência física e emocional. As mulheres e raparigas também vivem com traumas, tendo testemunhado assassinatos de alguns dos seus familiares, amigos e conhecidos nas suas comunidades de origem e, portanto, necessitam de serviços de apoio para superar o trauma.
Por forma a reestabelecer a saúde mental e psicossocial, alinhada à estratégia governamental sobre Políticas e Gestão de Deslocados Internos, aprovada pelo Conselho de Ministros através da Resolução n°. 42/2021, de 8 de Setembro, a Associação ActionAid Moçambique (AAMoz) com o financiamento da Agência das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), desenhou o projecto “Protecção aos Deslocados Internos, Famílias Anfitriãs e Pessoas de Interesse Afectadas pelos Ciclones Ana, Gombe e Freddy” nas províncias de Nampula, Zambézia e Niassa, para garantir a protecção de 58.002 pessoas, ou seja, 35.652 deslocados internos e 22.350 membros das comunidades de acolhimento.
A AAMoz juntamente com os governos provincial e distrital, Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastres (INGD), Direcção Provincial de Saúde (DPS), Serviço Distrital de Saúde, Mulher e Acção Social (SDSMAS) e com o Instituto do Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ) prestaram serviços de protecção, principalmente contra a VBG, e apoio de Saúde Mental e Psicossocial. Foram igualmente prestados serviços através de Brigadas Móveis de Protecção e Saúde em 2022, e o foco em 2023 foi reforçar as capacidades dos agentes de protecção, assistentes de protecção e pontos focais de protecção para serem capazes de fornecer os serviços básicos de Saúde Mental e Apoio Psicossocial às comunidades, incentivando mais deslocados internos e as comunidades anfitriãs para abordar e utilizar os serviços nos centros de saúde das comunidades.
No âmbito do projecto Protecção, foram capacitados funcionários governamentais, mulheres e comunidades sobre prevenção da VBG, mitigação de riscos, gestão de casos, encaminhamento e resposta para além do envolvimento da comunidade na prevenção da VBG, mensagens comunitárias e estabelecimento de novos Espaços Seguros.
Tomásia Zacarias, tem 37 anos, dois filhos e reside no centro de reassentamento de Gogodane, na província da Zambézia. É exemplo de uma mulher forte, resiliente e inspiradora. Natural do distrito de Palma, província de Cabo Delgado, viu-se deslocada da sua comunidade juntamente com o seu marido e mais dois filhos, devido aos ataques terroristas.
Em Junho de 2020, enquanto dormia, foi despertada pelo som dos disparos que ecoavam na sua comunidade. Sem hesitar, ela e sua família abandonaram tudo, e correram para o mato em busca de segurança.
“Não conseguimos levar nada. Só saímos de casa com as roupas que trazíamos. Ouvimos disparos e corremos para o mato. Estava com medo de morrer. Pensei que aquele seria o meu último dia de vida. Foi uma noite muito triste que nunca mais sairá da minha memória", contou Tomásia, com lágrimas nos olhos e cuja dor desse momento difícil, ainda ecoa nas suas palavras.
Durante dois meses, Tomásia e a sua família sobreviveram nos confins do mato, alimentando-se de frutos silvestres e plantas para enfrentar à adversidade e o medo da morte os assombrava diariamente.
“Ficamos no mato praticamente dois meses. Comíamos algumas frutas e plantas que encontrávamos. Foram momentos difíceis para nós. Não tínhamos contacto com a nossa comunidade e nem informação do que estava realmente a acontecer”, explicou.
Tomásia e algumas pessoas que fugiram para o mato, regressaram a comunidade e foram comunicados à sua chegada, que a zona não estava segura e os ataques persistiam.
“A meio ao sofrimento, decidimos regressar à Palma porque no mato poderíamos morrer de fome. Quando chegamos bem perto da nossa comunidade, encontramos pessoas que informaram-nos que a situação ainda não estava boa, que seria melhor fugir”, explicou.
Graças a intervenção de uma organização humanitária, Tomásia e a sua família foram conduzidas a uma zona segura, o que culminou com o reassentamento em Gogodane, no distrito de Namacurra.
No novo ambiente, com a ajuda da Associação ActionAid Moçambique (AAMoz), Tomásia encontrou apoio e oportunidades transformadoras, integrando-se a um grupo de 35 mulheres, membros do Espaço Seguro.
“ActionAid veio nos ajudar muito. Nem temos como agradecer. Através do Espaço Seguro, falamos abertamente sobre os nossos problemas e encontramos soluções. Fomos capacitadas para sensibilizar a comunidade sobre a Violência Baseada no Género, uniões prematuras, denúncia e encaminhamento de casos de violência através de teatro, palestras e dança. Sentimos que as mulheres estão mais informadas sobre os mecanismos de denúncia contra violência”, disse.
Determinada a reconstruir a sua vida, Tomásia e outras mulheres do Espaço Seguro não se deixaram abater pelas adversidades. Com coragem, criaram um plano para garantir geração de renda e um recomeço sólido.
“Com o apoio da ActionAid, recebemos um montante que investimos na compra de capulanas. Essas capulanas foram comercializadas e o lucro impulsionou o início de negócios focados na produção e venda de arroz, mandioca, feijão, milho entre outros bens de primeira necessidade”, referiu, tendo acrescentado que o grupo tem feito a actividade de Poupança e Crédito Rotativo (PCR) para garantir geração de renda.
Segundo fez saber, com os ganhos das actividades, investem na compra de materiais escolares e vestuário, o que proporcionam às crianças a oportunidade de acesso à educação, um elemento fundamental para a reconstrução do futuro. Além disso, parte dos recursos foi destinada à reabilitação das suas casas.
A iniciativa empreendedora de Tomásia não só impactou positivamente na sua família, mas também inspirou outras mulheres da comunidade a buscar caminhos de autossuficiência. O negócio não se limitou apenas a ser uma fonte de renda, tornou-se um símbolo de resiliência, cooperação e superação, ao mostrar que, mesmo diante de grandes desafios, é possível construir um futuro mais promissor com determinação e trabalho árduo.
As intervenções da AAMoz não apenas impactaram positivamente as mulheres da comunidade, mas também resultaram numa mudança significativa na percepção e na denúncia de casos de VBG. Tomásia, com determinação, tornou-se uma agente de transformação, que contribui para a construção de Espaços Seguros e consciencialização da comunidade sobre a importância de combater a Violência de Baseada no Género.
Hoje, Tomásia, é uma mulher resiliente que, através da sua história, inspira esperança e mostra como a força interior pode superar as adversidades mais sombrias.