SOCIEDADE CIVIL EM CABO DELGADO INCONFORMADA COM A PROPOSTA DE LEI DAS ORGANIZAÇÕES SEM FINS LUCRATIVOS
As Organizações da Sociedade Civil em Cabo Delgado, mostraram-se inconformadas esta sexta-feira, (10), com alguns artigos da Proposta de Lei das Organizações Sem Fins Lucrativos depositada no parlamento a 29 de Outubro de 2022. No seu entender, violam a Liberdade de Associação, Carta Africana dos Direitos Humanos e a Constituição da República.
Chamados a intervir sobre a Proposta de Lei, os membros do Movimento de Associações e Organizações Sociais de Cabo Delgado, não se fizerem de rogados, falaram de tudo o quanto lhes vinha à alma, com objectivo único de salvaguardar os seus direitos e bem-estar das comunidades mais desfavorecidas.
Lurdes Namoropolo, é membro da Associação Moçambicana de Educação Comunitária (AMEC), diz não perceber a ideia do governo de criar este novo diploma legal que em nada beneficia a população de Cabo Delgado.
“No meu distrito tem postos administrativos que ficam muito distantes. Pode passar um ano sem chegar um director da saúde, da educação e de outras áreas. Sempre nos deparamos com situações complicadas nas zonas mais recônditas da nossa província e tentamos sempre que possível encontrar soluções para os problemas locais”, disse Namoropolo, acrescentando que tem esperança de que esta Proposta de Lei seja reprovada e que Deus possa doptar os parlamentares de muita coragem.
Já Abudo Manana, representante da Associação Kuendeleya, não tem dúvidas de que o governo quer ditar regras com esta nova Proposta de Lei “que não nos identifica em nada”.
“O povo vos confiou este poder. Um dia vão deixar de ser deputados e vão querer trabalhar nas organizações”, desabafou Manana.
Prosseguindo, mostrou-se incrédulo com tentativa do governo, de perseguir apenas associações e organizações sociais nacionais que desempenham um papel relevante na melhoria de vida das populações marginalizadas, em detrimento de outras.
“Querem dizer que as fundações, organizações religiosas e desportivas, não financiam o terrorismo? O caso dos Mambas não será branqueamento dos dinheiros? Os takos dos putos onde foi? Será que não vai sair uns 100 mil dólares para financiar os gajos lá do outro lado? Os religiosos não vão desviar os dízimos? E aquele dinheiro de sexta-feira do _tchuma_ não será para financiar os gajos lá do outro lado? Esta lei não nos identifica”, rematou.
Kamessa Fabião Kamessa, jornalista e membro da plataforma da Mocímboa da Praia, um dos locais afectados pelo terrorismo, diz que esta lei trás consigo muitas lacunas, como por exemplo, “ao considerar que devemos fazer relatórios. Existem associações de pessoas que não sabem ler e nem escrever – associações de camponeses, agricultores e pecadores. Estas fazem diferença na comunidade. Com esta proposta, estaremos a pôr em causa a sua existência”, sentenciou.
Abdul Tavares, do CCD, questiona “onde está a nova nomenclatura na Constituição da República? O activista esperava que o governo do dia, deixasse o seu legado em termos de consolidação da democracia “mas está a voltar atrás”.
Tavares acredita que alguns deputados “são corajosos e não vão deixar esta proposta passar” por forma “a contribuir para o desenvolvimento do País”. O mesmo entende que “o governo não tem capacidade de penetração nos distritos, precisam das associações. Temos pessoas nas aldeias que trazem soluções aos problemas nas suas comunidades”, afirmou.
Emersson Ubisse do Conselho Cristão de Moçambique (CCM) considera que o “governo tem imensas dificuldades de monitorar actividades de campo e só consegue com apoio “das nossas organizações. Sendo, por isso, que “não concordamos com esta lei”.
Indicou ainda que este diploma legal está desajustado a realidade e o Executivo deveria dar oportunidades a Sociedade Civil para discutir a Lei das Associações, para adaptá-la ao contexto actual. A Proposta de Lei “que estamos a discutir, é um verdadeiro atentado à liberdade de associação”.
Numa breve reunião de balanço, havida minutos depois da auscultação, a Sociedade Civil concluiu que o encontro foi positivo, na medida em que conseguiu fortalecer a união e coesão dos diferentes actores. Para os activistas, encontros desta natureza deveriam acontecer de forma regular, para que “não nos possam cegar, partir os ossos e violarem os nossos direitos”.
Refira-se que a Proposta de Lei das Organizações Sem Fins Lucrativos, atribui poderes excessivos ao Governo para reconhecer, controlar, extinguir, impor regras e exigências exageradas as associações, usando razões infundadas, como por exemplo, a prevenção do financiamento ao terrorismo.